terça-feira, 18 de setembro de 2018

Autismo: o ponto de vista de um pai

  Lembro-me perfeitamente o dia em que Eliza nasceu. Pequenininha, rosadinha, com os olhos brilhado e mexendo-se de um lado para o outro, como se buscassem alguma coisa. linda! Dei seus primeiros banhos em casa. Coloquei a fraldinha(que parecia enorme!), a roupinha.  Eu era pai de uma menina saudável e esperta.


     Logo nos primeiros dias de vida, aconteceu acho que o primeiro sintoma: Estava um dia frio, e resolvemos adiar o banho da tarde. Daríamos um banho só de noite, antes de irmos dormir. 
     Passando um pouco da hora do banho, Eliza começou a reclamar resmungando.  Foi aumentando até desatar em um choro quase gritado, como se estivesse sentindo dor. 
     Fomos ao médico imediatamente. O doutor examinou, analisou e diagnosticou: "ela não está com dor. Leve-a para casa, dê um banho morno demorado, deixe que mame e vamos ver o que acontece."
     Fizemos isso, e, para nossa surpresa, ela mudou de muito brava, para a bebezinha mais serena do mundo.
     Foi à partir de aí que notamos que nenhum dos banhos poderia ser adiado. Teriam que ser exatamente na mesma hora, com a água em uma mesma temperatura.
     Aos dois meses lhe comprei um vestidinho lindíssimo. Um tecido delicado, cheio de frufru e besteirinhas. A vestimos com este vestido para irmos à Igreja em um domingo pela manhã. Desde o momento em que colocamos o vestido nela, e por todo o caminho, ela se sentiu incomodada, choramingava e puxava o vestido em todos os cantos, como se estivesse dando uma forte alergia. Resultado: tivemos que deixá-la só com a roupa de baixo e fralda.
     Aos cinco meses, estávamos andando por nosso caminho normal, eu a carregava no colo, quando, não me lembro por que motivo, decidi mudar a rota. Imediatamente Eliza começou a reclamar e jogar-se em direção à rua onde costumávamos passar.
     A partir de aí, comecei a observar com mais atenção. Fiz testes de mudança de rotina. Tentávamos mudar as coisas de lugar. Nada disso era possível. Ela não permitia.
     Se eu já tinha uma leve suspeita, elas foram se confirmando com o tempo: eu tinha uma filha autista!

     

     A medida que ela crescia, eu notava isso mais e mais. Minha esposa não aceitava. Dizia que eu a mimava muito e que as crianças têm algumas manias mesmo. 
     Fomos nos apegando mais e mais. Eu não via a hora de chegar em casa para poder abraçá-la. Ela sempre sabia a hora que eu estava chegando. Parece que tem um relógio suíço dentro dela. Quando eu trabalhava fora, em outra cidade, só vinha para casa nos finais de semana. Chegava na sexta-feira muito tarde. Ela dormia na mesma hora de todas as noites, mas, quando se aproximava a hora de eu chegar, abria os olhos e, imediatamente sentava-se na cama e me esperava.
     Quando tinha dois anos, a levei ao supermercado. Na seção de festas, ela apontou para uma velinha de aniversário e disse: "OTO". Era o número oito!! Coincidência, pensei. Apontei aleatoriamente para todas as velinhas e, uma a uma, ela reconheceu todos os números.
     Quando  Chegamos em casa, peguei uma folha enorme de papel e comecei a escrever . Ela não só reconheceu os números, mas também as vogais. Aprendeu vendo tv! Também sabia cores, formas geométricas e um monte de coisas. Fiquei babando!!
     Decidi que já não ficaria mais longe. Um salário gordo não compensava. Trabalharia por conta própria e ficaria o dia todo ao lado do meu anjinho. O ganho seria menor, mas a recompensa valia a pena. 
     Trabalhava em casa e Eliza ficava o tempo todo por perto.
Pudemos compartilhar mais, brincar mais. Aprendi mais sobre autismo com ela que com todos os livros e publicações que li desde os treze anos de idade. 

     O diagnóstico oficial, com o Neuropediatra só veio aos cinco anos. Mas nosso trabalho começou quando ela só tinha meses de idade. 
     O resultado de nossa luta está aí: uma menina alegre, divertida, dinâmica, muitiíssimo inteligente, gosta de estudar, lê bastante, aprende rápido, na maior parte das vezes tem disciplina.

     Tem suas limitações: quase não socializa, exceto com um muito pequeno círculo de pessoas, jamais conversa com quem não conhece, não vai sozinha nem na esquina de casa, tem inteligência de uma criança de mais de dez anos, mas seu comportamento é de uma criança de 4 anos. Hiperseletiva na alimentação. Muito difícil e caro alimentá-la.
     Mas, essas limitações não fazem com que diminua meu amor e minha dedicação. Minha meta é torná-la auto-suficiente quando chegar a ser adulta. Um dia vou faltar. Não quero que ela seja dependente de ninguém.
     Por causa de Eliza, temos estudado e procurado saber cada vez mais sobre TEA. Procuramos divulgar, conscientizar e apoiar autistas e suas famílias, que também precisam de apoio.
     É uma luta sem trégua. A maior barreira é o preconceito e a falta de conhecimento das
pessoas. É contra isso que lutamos. 
Sérgio Kocinba: Um orgulhoso pai de uma criança com autismo!





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